A Smartmatic é um enigma.
A empresa surgiu do nada e, de imediato, conseguiu um contrato multimilionário velado em um processo eleitoral que acabou reafirmando o mandato de Hugo Chavez, diminuindo sua oposição política.
Ao contrário do que dizem altos níveis da magistratura brasileira, a Smartmatic é uma companhia Venezuelana, operada por Venezuelanos. No entanto, a identidade dos verdadeiros donos da empresa se esconde difusa em meio a uma trama de holdings e laranjas. Ao que tudo indica, porém, a Smartmatic é segurada desde seu nascimento por conhecidos homens de negócios Venezuelanos que preferem o anonimato dado suas afiliações políticas e, talvez, por gerenciarem os interesses de altos oficiais governamentais Venezuelanos.
A máscara internacional.
A Smartmatic é tida como uma empresa Americana por aqueles que desconhecem sua origem real, seja por ignorância ou por maldade. Seus verdadeiros donos - provavelmente a elite Venezuelana em variadas raízes políticas - permanecem escondidos através de companhias de holding sediadas em Barbados e nos Países Baixos (Holanda).
Desde seu primeiro serviço em massa surgiram suspeitas de serem altamente suscetíveis a fraudes, ainda que nunca tenham (e talvez nunca venham a ser) sido comprovadas verdadeiras. Apesar disso, ganhou inúmeros mercados eleitorais além de Venezuela e Brasil, como em partes dos Estados Unidos da América, através de sua subsidiária Sequoia.
Smartmatic, uma empresa Venezuelana.
A Smartmatic foi fundada no fim dos anos 1990 por três Venezuelanos: Antonio Mugica, Alberto Anzola e Roger Pinate.
Segundo conversas entre Antonio Mugica e agentes políticos, os três venezuelanos desenvolveram uma rede capaz de suportar milhares de entradas simultaneamente. Sua primeira aplicação foi em caixas eletrônicos no México, porém a eleição presidencial dos EUA nos ano 2000 levou o trio a considerar aplicar o sistema a uma plataforma de votos eletrônicos.
Em 2004 a Smartmatic formou consórcio com uma das principais empresas estatais Venezuelanas, a CANTV (Compania Anonima Nacional Telefonos de Venezuela) e a Bizta, empresa dos mesmos donos da Smartmatics. Esta última já havia recebido no mesmo ano cerca de 200 mil dólares em investimento de dinheiro público através do FONCREI (Fondo de Credito Industrial), uma espécie de BNDES Venezuelano, colocando um alto agente político Chavista na mesa diretora da Bizta.
Quando este investimento público na Bizta ganhou manchetes, a empresa “devolveu” a pequena fortuna alegando que era apenas um “empréstimo”, retirando o Chavista de seu quadro de conselheiros. É o mesmo esquema que veio a público no Brasil ultimamente no caso JBS-BNDES.
Investidores secretos.
Antonio Mugica assume, em diferentes ocasiões, aos agentes políticos interessados em negócios que ele, Anzola e Pinate são os donos da Smartmatic, mas que existiam ao redor de outros 30 investidores que permanecem anônimos aos olhos do público.
Jose Antonio Herrera, sogro de Anzola e primo do Embaixador Venezuelano nos EUA (Bernardo Alvarez), disse a oficiais políticos em 2004 que os parceiros silenciosos da Smartmatic eram em sua maioria da elite Venezuelana, alguns, inclusive, apresentando-se como opositores de Hugo Chavez. No entanto, os rumores mais fortes ditavam que os lucros iniciais da Smartmatic vinham de contratos com o Ministério da Defesa Venezuelana realizados através do então Ministro da Defesa Jose Vicente Rangel, quem Hugo Chavez mais tarde promoveria a Vice Presidente da Venezuela.
Coincidência ou não, Gisela Rangel Avalos, filha de tal Vice Presidente, era a chefe local do setor de registros corporativos onde e quando a Smartmatic foi registrada, o que contribui ainda mais para a alegação de envolvimento do próprio então Vice Presidente Venezuelano na empresa que hoje guarda as eleições de países como o Brasil. Estes rumores, na época, também conectaram o mentor político Chavista Luis Miquilena como sócio da companhia Smartmatic.
O disfarce Americano.
Antonio Mugica, enquanto participava das negociações com o Conselho Eleitoral Nacional Venezuelano (CNE) de 2004, apresentou a empresa como se fosse uma companhia Estadunidense, registrada em Delaware, com escritório em Boca Raton, Flórida.
Agentes políticos da Embaixada Venezuelana tiveram diversas reuniões com Mugica para facilitar a documentação internacional da empresa e gerar uma liberação de trabalho para os Estados Unidos. Mugica afirmava que os escritórios da companhia situavam-se nos Estados Unidos da América, no entanto, a maioria dos 70 empregados da empresa permaneciam em Caracas, Venezuela.
Em 2005, em um relatório a imprensa, a Smartmatic então afirma que passava a ser duas companhias diferentes sob uma holding Holandesa. A empresa nos EUA, com registro em Delaware e escritório em Boca Raton, então passava a ser tecnicamente uma empresa americana, comprando, no mesmo ano, a estadunidense Sequoia Voting Systems, o que o permitiria afirmar que “todo o maquinário eleitoral é montado em Nova Iorque”.
Ainda que suas operações nos EUA fossem importantes, mais da metade dos negócios feitos pela Smartmatic situavam-se foram do eixo Venezuela-Estados Unidos.
A contraparte da Smartmatic Americana agora não mais estava registrada na Venezuela, mas em Bridgetown, Barbados, onde Antonio Mugica alega que a equipe de vendas internacionais situava-se. A internacionalização e aporte de capital também levou a produzir o maquinário vendido pela empresa em fábricas da China, com alguns componentes feitos em Taiwan, e ainda produzindo outros itens da Smartmatic na Itália, através da companhia Olivetti (que produziu as máquinas originais utilizadas na Venezuela). A equipe de pesquisa e desenvolvimento, o coração da empresa, continuava localizado em Caracas.
Primeiros indícios de fraude.
A oposição ao governo Venezuelano tem certeza de que foram roubados de sua vitória no referendo de Agosto de 2004, que deu ganho a Chavez através do sistema da Smartmatic.
Desde então houveram pelo menos oito análises estatísticas dos resultados do referendo. A maioria cruzando resultados com as pesquisas de boca de urna, antigos resultados eleitorais e assinaturas próprias dos votantes. Um estudo obteve o registro de dados do sistema da CANTV e supostamente provou que as máquinas da Smartmatic mandavam sinais bidirecionais e mostravam irregularidades na forma como reportavam os resultados ao servidor do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) durante o referendo.
O fato mais suspeito apontado no sistema da Smartmatic é que as máquinas contatavam o servidor do sistema antes de imprimir os resultados, providenciando uma oportunidade, ao menos, de mudar os resultados e sobrepor os rudimentares modos de checagem das missões internacionais de recontagem. Desde 2004 a CNE assumidamente diz não ter repetido tal sistema.
Ainda em 2005, um técnico de informática foi capaz de demonstrar como era simples vencer os supostos modos aleatórios de segurança de protocolos e, portanto, o segredo dos votos, através de um simples programa de computador para Windows, sistema operacional utilizado nas máquinas da Smartmatic. Um simples programa enviado pela internet era capaz de burlar a segurança da máquina. Oficiais da Smartmatic não negaram o fato de que o programa era eficaz, mas alegaram que tal procedimento era improvável em uma verdadeira eleição de larga escala.
A explicação, obviamente, não foi aceita pela oposição, o que levou a um boicote de ao menos de 75% da população nas eleições daquela época, derrubando a confiança pública Venezuelana na entidade do Conselho Nacional Eleitoral. A infelicidade do boicote foi resultar em um controle total de Hugo Chavez na Assembleia Nacional Venezuelana, não tendo opositores eleitos.
Corrupção.
Se a Smartmatic consegue driblar alegações de fraude, há ainda a questão da corrupção. Antes da Smartmatic surgir, a lei Venezuelana ditava a automatização do processo eleitoral para limitar fraudes, e as empresas ES&S americana e Indra Espanhola já haviam vendido seus sistemas para o país. Porém, em Setembro de 2003, quando o Conselho Nacional Eleitoral passou a ser capitaneado pelo regime pró-Chavista, imediatamente surgiu a ordem de substituir todos os sistemas existentes. Declarando ser um caso emergencial, mesmo sem ter nenhuma votação urgente, a CNE descumpriu o processo normal de contrato público e iniciou um processo velado de licitação, vencido pela novata Venezuelana Smartmatic. O contrato foi fechado em 128 milhões de dólares, prometendo a entrega de 20 mil máquinas de votação (máquinas lotéricas recondicionadas) a serem construídas.
Imediatamente houveram dúvidas sobre como uma companhia virtualmente desconhecida, sem experiência naquilo que prometia cumprir, conseguiu fechar tamanho contrato.
Antonio Mugica alega que tudo foi correto, apesar de assumir que houve lobby governamental ao contratar o ex-Vice Ministro de Interiores Venezuelano Morris Loyo para fazer o meio de campo. Mais tarde surgiriam denúncias de que a Smartmatic havia pago a conta em um resort em Boca Raton, Flórida, para o Presidente do Conselho Nacional Eleitoral Jorge Rodriguez, em outubro de 2005. A companhia alegou que Rodriguez reembolsou a Smartmatics pela estada, durante a qual Rodriguez examinou o sistema eleitoral que a Smartmatic estava desenvolvendo. Mais tarde haveriam denúncias de que Rodriguez estava fazendo lobby para a Smartmatic em outros países.
Em dezembro de 2005, Mugica afirma que considerava terminar o negócio com CNE por causa das alegações de fraude que prejudicavam a imagem da empresa. Mugica alegava que a CNE havia comprado o software necessário para operar as máquinas eleitorais sem o intermédio de sua empresa - era objetivo da CNE Chavista alcançar a “independência tecnológica” - porém a própria CNE volta atrás e contrata a Smartmatic para administrar uma eleição. Naquele mesmo ano, a Smartmatic já tinha diversos negócios fechados com países da América Latina, e negociava com países da Europa e Ásia, tendo agentes na Tailândia, Malásia e Filipinas), além de trabalhar em diversos estados dos EUA através da empresa fachada Sequoia.
Artigo baseado em documentos trazidos a público pelo Wikileaks em https://wikileaks.org/plusd/cables/06CARACAS2063_a.html
Artigo baseado em documentos trazidos a público pelo Wikileaks em https://wikileaks.org/plusd/cables/06CARACAS2063_a.html
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