Não caiam na falácia do "sharing economy", não tem nada de compartilhado nela. Não vou entrar na discussão de legalidade, documentação, e os perigos associados, vou me ater à uma análise puramente baseada na premissa do "compartilhamento econômico", e você, meu amiguinho liberal, publicitário, marketeiro, entusiasta, neo-economista, dono de start up, desenvolvedor, profissional de SEO, blogueiro, usuário de aplicativos, apple lover, viajante, viajado, viajandão, hater de taxi, hater de conservadores, hater de haters, ou alguém que sequer ouviu falar de "economia de compartilhamento", que seja, pode ficar bravo que eu não ligo.
O "sharing economy" nada mais é que uma velha técnica de marketing onde se mascara um serviço antigo com roupa nova e um nome socialmente aceito pra tentar lucrar mais, como tentar tirar as últimas gotas de suco do bagaço fruta apodrecida e seca. Para ser específico, o serviço é fundamentalmente o mesmo com um ou outro toque diferente que, para quem olha sem aprofundamento parece ser 100% inovador.
Vamos aos exemplos.
Exemplo 1: Uber. O Uber não é compartilhamento, os motoristas são cadastrados, existem regras para prestar o serviço, não é você compartilhando o seu carro com os seus vizinhos, são motoristas/funcionários cadastrados em uma empresa/corporação multinacional que lucrou só nos seus 5 principais mercados dos EUA em 2014 cerca de um bilhão de dólares (dinheiro que vai para os criadores do aplicativo, cujo gasto limita-se em sustentar o programa que "possibilita" o serviço e propagandear seu uso, não to falando do lucro dos motoristas). A estimativa para 2015 em todos os mercados gira em torno de 10-15 bilhões de dólares somente para a marca. Mas não se engane, pois o esquema modinha de start-up não é lucrar em cima do consumidor final, sim no investidor: o Uber já levantou mais de 50 bilhões de investidores com essa prerrogativa de "somos inovadores, somos economia de compartilhamento, é o novo ciclo do mercado, sou dollynho, seu amiguinho, beba muito líquido".
Exemplo 2: AirBnB. O AirBnB não é compartilhamento, as casas, apartamentos, cabanas, tendas, redes de dormir, barracos, baixos de ponte, camas de fakir, são alugados! É aluguel clássico só que, em vez de você ir até uma imobiliária para alugar por um mês com um contrato de tempo mínimo, você aluga direto do proprietário por alguns dias! Mas você compartilha com o proprietário? Não. Você entra na propriedade depois do proprietário sair. Você aluga por um período um local para usar sozinho ou com seus amigos, não com o dono. Tipo um... hotel. Né? Não é como se você compartilha-se o seu banheiro, acorda-se e a pessoa que alugou estivesse fazendo o seu café da manhã na cozinha. O AirBnB está avaliado em 10 bilhões de dólares de investidores e, em todas transações feitas pelo site em 2015, deve faturar em torno de 900 milhões de dólares, tendo como custo apenas a sustentação do serviço virtual.
Exemplo 3: Peixe Urbano. Esse aqui e chutar cachorro morto (que expressão horrível, aliás), mas é justamente esse o ponto: morto! Não é economia pois simplesmente não se sustenta, foi a moda do momento e logo morreu. Não há desenvolvimento em lealdade e fidelidade dos clientes, pelo contrário, foi um negócio fundamentado em promiscuidade de consumo, quem usava Peixe Urbano só estava (me inclua nessa) interessado em preço baixo! Não importa se eu nem gosto tanto de fondue, olha só, tá 15 reais. Não importa se é naquele restaurante bosta, olha só, agora tá 10 reais. Não importa se eu talvez nem lembre de ir pois a data é para daqui sete meses e eu comprei para a minha namorada que até lá já terminamos, agora tá 5 reais! Compra porque tá barato! E olha o que se tornou hoje, uma vitrine para produtos falsificados ou de baixa qualidade que muitas vezes nem no país estão, virou uma espécie digievolução das e-shops mutretas do também falecido Mercado Livre. Se antes o Peixe Urbano parecia não valer a pena, hoje é certeza que não vale. Qual foi a última vez que você entrou lá?
Não tem nada de compartilhamento, não tem nada de salvação do mundo, é a mesma fórmula de sempre: renovação de um produto/serviço antigo + nome novo = lucro.
O que acontece, trabalhando essa falácia de "compartilhar é o novo consumidor" e "sinta-se culpado por consumir, seu capitalista safado!", é que essas empresas pegam onda em uma tendência de comportamento do mercado que já vem surgindo há mais de uma década, em que as pessoas mais sensíveis começaram a perceber que a economia ia entrar em crise, deixando de gastar tanto, conversando com outros sobre isso, o que leva à um entendimento coletivo subconsciente de que gastar, gastar e gastar já não têm mais a beleza de antes. Convenhamos, ostentação é a moda mais babaca que surgiu nos últimos tempos, por que? Por que é totalmente contrária ao que realmente está acontecendo no mundo. Só que, por trás da "sharing economy" estão aquelas pessoas que ainda trabalham nessa consciência rasa de lucro sem fim, e por isso mascaram suas verdadeiras intenções. Isso é o marketing: disfarçar intenções. Quem tá realmente lucrando com o "sharing economy" afinal? As empresas! É a mesma coisa de sempre! Isso é motivo para não apoiar e não utilizar os serviços? Não, não é essa a minha intenção. A minha intenção é apenas quebrar essa bobagem de pensamento regurgitado de que existe algo como 'sharing economy" ou "economia de compartilhamento", não existe, o "sharing economy" é tipo um culto, uma crença que se cria em cima da ignorância da maioria, se tem algo sendo compartilhado nela é um pouquinho do gigantesco lucro feito pelas empresas com seus funcionários, e eu espero ter te ajudado a perceber isso.
Ah, mas e aquele aluguel barato por um espaço na mesa em um salão com mais 20 pessoas que mais parecem fingir trabalhar do que realmente trabalham (é, alguns diriam que eu estou descrevendo uma sala na prefeitura), não, aquilo também não é economia de compartilhamento. Aquilo é economia de colaboração! Por isso se chama COworking, é a concepção de que se você juntar todos os pokemons em uma pokebola só eles vão aprender a lutar juntos e não um contra o outro.
Aí você lê em algum jornal bundinha o termo "sharing economy" relacionado ao Netflix. Isso é um erro comum para quem não tem histórico em internet e tende a misturar um serviço pago de stream com a velha (e, aos poucos, extinta) realidade de compartilhamento de arquivos como baixar o filme por torrent, ou usar o Limewire, Kazaa, ou então uma música no (quem lembra?) Napster. A ideia que alguns jornalistas incompetentes tentam passar hoje é que usar o Spotify é o mesmo que baixar mp3 em um sistema P2P, o que nem de longe é parecido e uma ofensa a dedicação de quem ficava horas esperando terminar o download daquele MP3 bichado.
Crowdfunding e crowdsourcing, ou no bom português, uma vaquinha. Esses o nosso senso tende a crer que estamos compartilhando, que fazemos o bem. Não deixa de ser fazer bem na maioria dos casos, mas o "compartilhar" nem sempre procede. Aliás, é possível afirmar que 99,99999...% das vezes em que entramos em uma vaquinha referente à um produto ou serviço, a nossa participação está atrelada diretamente atrelada `algum tipo de recompensa. Se "doamos" quantia X, recebemos Y como recompensa, se doam quantias 5X, recebemos um "prêmio" 5Y, e, obviamente, acesso ao produto/serviço no qual estamos investindo. O que revela o seguinte, ao entrar em um desses esquemas o que você está fazendo é entregar o dinheiro antes do cozinheiro fazer a pizza para que ele compre os ingredientes. Não tem mistério. Pode até parecer um compartilhamento, mas esse compartilhamento termina no momento em que você recebe algo em troca, então vira uma simples compra, trocar dinheiro por um produto ou serviço. É claro que, aqui, limitam-se às situações.
Que ponto eu quero chegar com essa pilha de palavras que ninguém lê, apenas este: não se deixe levar pelo calor das palavras. Empresas querem lucro. Prova disso é que aquelas pessoas que realmente trabalham com compartilhamento, ou seja, com intuito social mais do que financeiro, tendem a chamar seus empreendimentos de projetos. Por que? Porque não se sustentam! Não duram mais do que o tempo necessário e possível, não se tornam empresas, não se tornam corporações, apenas fazem o que devem fazer: compartilhar o que quer que seja, partindo deles, não de terceiros.
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