É fato conhecido que o exército americano atua no mundo inteiro, mas poucos sabem o quão presentes eles estão na América do Sul. Em 2009, um acordo entre Colômbia e EUA oficializou a ação de militares e paramilitares norte-americanos ao sul da linha do Equador, sob o pretexto de lutar com mais eficácia contra o narcotráfico e o terrorismo.
As primeiras feições públicas dessa interação dos EUA no continente surgem em 2000, quando o governo dos Estados Unidos traz a tona o Plano Colômbia, que já vinha sendo divulgado em discursos do então presidente colombiano Andrés Pastrana desde 1998, negociado com o então presidente americano Bill Clinton.
As divergências do que seria a operação surgem desde seu princípio. Pastrana afirmava que o objetivo original era erradicar o tráfico através de planos de desenvolvimentismo, e denunciava que a intenção original colombiana teria sido deturpada e transformada em uma operação militar, tratando os próprios colombianos envolvidos no problema do tráfico e da guerrilha como inimigos da nação, negando o status de cidadãos e o fator histórico do tráfico e da luta na região. Disse o embaixador Robert White: “Os colombianos pediram por pão e vocês - americanos - deram pedras".
No fim das contas, quase 80% dos fundos direcionados no ano de 2000 para o Plano Colômbia foram dedicados ao setor militar e a luta armada, dinheiro esse que naturalmente seria gasto com providências americanas, focando menos de 20% na ideia original de desenvolvimento social.
De fato, o Plano Colômbia nunca teve como objetivo, pelo menos do lado americano, o progresso social da região, é apenas mais uma operação da política de “war on drugs” estado-unidense, e da indústria bélica americana que se sustenta através de infindáveis guerras.
Em 1988, um estudo do próprio departamento de defesa americano (US Defense Department), coletando dados ao longo de dois anos, chegou a conclusões curiosas dessas operações militares na Colômbia. Segundo o estudo feito por economistas, matemáticos e pesquisadores do National Defense Research Institute, a interjeição paramilitar teve efeito nulo na contenção do tráfico e, na realidade, só fez aumentar os lucros dos cartéis de cocaína colombianos em seu mercado americano.
Na segunda metade dos anos 1990, a administração Clinton ordenou um novo estudo sobre a eficiência das políticas de combate as drogas. O Rand Drug Policy Research Center concluiu que seria melhor investir 3 bilhões de dólares em tratamento, em vez de colocar mais verba em repressão. Tal conclusão foi rechaçada pelos responsáveis do governo.
Sem efeitos positivos na luta contra o tráfico, colecionando massacres nos conflitos armados, envenenando cidadãos colombianos com fumigações aleatórias, críticos do Plano Colômbia apontam o que possivelmente seja o verdadeiro objetivo da intervenção militar na região: a conquista de recursos naturais. Além de rica em petróleo na costa, a região amazônica é o Eldorado para a indústria do minério, e é um caixa rápido para o bem mais valioso dos últimos anos: a água.
O acesso militar americano pela Colômbia e outras bases no continente.
O acordo entre os dois países deu livre acesso ao comando militar americano a América do Sul, permitindo a entrada de tropas do exército e mercenários tratados oficialmente como “contractors”, ou contratados, de empresas paramilitares estado-unidenses como a Dynncorp e a Blackwater, nas bases aéreas, navais e territoriais colombianas. A principal delas é a de Palanquero, que sozinha recebeu um aporte de 46 milhões de dólares durante o governo Obama.
O contrato de tal investimento, feito em 2009, revela finalmente que a intervenção americana na região não visava apenas lidar com os problemas do tráfico de drogas, mas também ocupar espaços estratégicos para lidar com “ameaças regionais anti-americanas”, como a Venezuela e o governo chavista. O documento do Pentágono afirma que o investimento na base melhora “a capacidade dos EUA de responder rapidamente a crises, assegurando acesso e presença regional com custo mínimo” e contribui para “expandir capacidade de guerra aérea”. Evo Morales, presidente boliviano cocaleiro protestou na época: “as bases militares são contra os governos, os presidentes e os movimentos sociais revolucionários da América Latina. Essas bases não são para combater o narcotráfico”.
Base paraguaia.
A 300km do Brasil, 200km da Argentina e da Bolívia, na planície do chaco paraguaio, situa-se a base americana de Mariscal Estigarribia. Sua pista de pouso tem 3 quilômetros de extensão, maior do que qualquer aeroporto internacional da região, podendo receber os maiores aviões de carga do mundo, como o C-130 Hércules, C-5 Galaxy e o famoso B-52. Possui um gigantesco radar, sistema de aterrissagem noturna, amplos hangares e alojamentos capazes de abrigar 16.000 soldados (a cidade paraguaia tem 3.000 moradores, sendo a extensão da base maior que a própria cidade), tudo muito superdimensionado para os padrões das forças armadas paraguaias, que operam com oito aviões Xavante e Pillán de porte médio, e oito pequenos aviões Cessna. Apesar dos inúmeros registros, e em tempos de Google Earth, sua amplitude militar é negada pelo governo, tratada pela situação governamental apenas como uma extravagância do presidente Alfredo Stroessner na década de 1980.
“É uma pista fenomenal, mas o movimento é escasso. Neste ano, não mais de 80 aeronaves utilizaram a pista”, revela o major Ramón Ignacio Duarte, da Força Aérea paraguaia. “A pista é maior que a do aeroporto de Assunção”, afirma o coronel paraguaio Elio Flores Servín.
Qualquer defesa de que a base não é americana caiu definitivamente por terra quando, em 5 de maio de 2005, o Congresso paraguaio autorizou “exercícios e intercâmbios militares bilaterais”, concedendo imunidade a tropas americanas no país, sendo aprovado pelo Parlamento em julho do mesmo ano, e modificada em dezembro para que o acordo seja “prorrogável”. Segundo o acordo, os efetivos norte-americanos adquirem status de “funcionários diplomáticos administrativos”, podendo então entrar e sair do país sem autorização prévia, transportando armas e qualquer tipo de equipamento, tratado estendido também a qualquer produto, material e propriedade. Os soldados não precisam responder a qualquer dano a saúde, ao meio ambiente ou aos recursos da população e da região. Também é reconhecido as matrículas médicas e as licenças de condução de veículos levados ao Paraguai.
A posição da base é estratégica, está no coração do continente sul-americano. Não apenas situa-se a um par de horas de todas as capitais, como abraça militarmente, junto das bases colombianas, as regiões da Bolívia e da Venezuela, região de petróleo e gás natural, e de forte posição anti-estadunidense, além de estar fincada no aquífero Guarani, uma das maiores reservas de água doce do mundo, e na Tríplice Fronteira, local visado por Washington por ser reconhecidamente um dos principais pontos de encontro do crime organizado mundial.
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